Sabe aquele dia chuvoso em que você acorda, levanta-se, olha para o céu, volta para a cama mais alguns minutos ou horas? Pois é, isso já aconteceu muitas vezes comigo, porém naquele dia foi diferente. Levantei-me, mas não acordei, nem voltei para a cama. Fui tomar o “meu” café da manhã, e, no meio do café, ouvi o som musical do sino da igreja que tem perto de casa. Pensei: “Nossa! Por que o sino está tocando tão cedo? Não é a hora da missa, nem tampouco domingo…”
Os sinos da igreja, altos e impassíveis, têm o poder de transformar o som em presença; o ar vibra como se o toque fosse feito de matéria, tocando o ombro de cada pessoa. Às seis da manhã, ao meio-dia e às seis da tarde, eles se manifestavam como um lembrete de que o tempo está sempre à espreita. A mensagem que o som do sino traz ecoa como uma brisa suave e antiga, que parece tocar o coração com a delicadeza de uma flor e a profundidade de um oceano. Sua melodia, leve e cheia de peso emocional, traz memórias e significados ocultos.
Porém, naquela manhã, o badalar do sino me levou a uma viagem fantástica. Voltei no tempo, para quando a cidade de São Paulo era a “cidade da garoa”. Aquela São Paulo das mansões dos barões do café, da avenida Paulista. A cidade que despertava ao som do badalar dos sinos de suas inúmeras igrejas e campanários. Tomei um gole de café, sentindo-me na mansão de um barão do café, com o aroma do café passado na hora, o pão caseiro e a manteiga feita em casa.
Naquela manhã, os toques reverberavam no ar, trazendo uma sensação de paz e, ao mesmo tempo, de saudade — talvez de tempos que já passaram, de momentos guardados no fundo da alma. Os sinos convidam à contemplação, ao recolhimento, e, por um breve instante, tudo parece ficar suspenso, como se o mundo ao redor escutasse também.
Despertei da viagem com o som do último badalar do sino da igreja. No fundo, os sinos das cidades soam como uma lembrança de que o tempo, por mais que corra ou se esconda, está sempre conosco – tal qual um eco eterno de nossa própria humanidade.