A cápsula era um lugar apertado. Algumas vezes, me enroscava no companheiro de viagem; noutras, ele se enroscava em mim. Isso acontecia com mais frequência quando a parede ovular era sacudida.
Eu conhecia apenas aquele ambiente cheio do líquido que servia para nos proteger dos tremores e vivia curioso para saber o que havia do lado de fora.
De dentro, eu ouvia dizerem que os abalos eram causados por socos e pontapés. Sem sabermos o que eram socos e pontapés, viajávamos fadados a enfrentar turbulências imprevisíveis.
Entre mim e meu companheiro, eu era o mais atento. Por isso, sabia de coisas que ele ignorava, como, por exemplo: lá fora havia um ser que emitia sons suaves e amorosos quando conversava conosco. Esse ser frequentemente acariciava a parede da nave e, pelo que ouvia dizer, esse ser era mamãe.
Mamãe conversava conosco e nos chamava de filhinhos. Até então, não sabíamos qual tipo de ser era mamãe. Sabíamos apenas que a suavidade da voz nos transmitia calma e segurança.
Ainda tenho lembranças da última vez que a nave foi sacudida. Parecia que estávamos atravessando nuvens de imensos asteroides. Ouvimos sons guturais, ofensivos; gemidos e plangeres, até que estampidos silenciaram os terremotos.
— Levaram o monstro! — alguém gritou.
A partir daquele momento, nossa viagem transcorreu em paz. Trinta e quatro semanas depois, a nave estava pronta para encerrar a missão.
Introduziram uma agulha em mamãe, e ela adormeceu. Ouvi vozes: bisturi, pinça, tesoura, afastador, aspirador, espátula, válvula. (Não exatamente nessa ordem). E, de repente, a luz intensa invadiu o interior da nave.
Um ser mascarado me puxou e cortou o cordão que me ligava à cápsula. Eu chorei com medo daquele ser estranho me segurando pelas pernas e batendo em meu bumbunzinho. Em seguida, fizeram o mesmo com o meu companheiro de viagem. Mas ele não quis acordar.
Outro ser me aconchegou no colo e, em seguida, me colocou ao lado de mamãe, dizendo: “Parabéns! Seu filho nasceu perfeito e saudável”.
O tempo passou… Mamãe me contou que teve uma gravidez complicada, pois meu pai não queria que nascêssemos. Ela foi guerreira, foi heroína; teve a força de mil leoas. Sorte a dele.
Faz vinte anos que me tornei um cirurgião cardiovascular conceituado, capaz de ter realizado, com êxito, a cirurgia do homem do quarto 16: meu pai.