Em tempos de guerra, inundações, secas e muitas vidas perdidas, falar de saúde é como se saíssemos do tom, perdêssemos o ritmo, esse tal ritmo que entramos desde a COVID-19; onde viver de forma abundante e próspera é quase que um delírio ou uma sorte de poucos. Feito coisa rara. Meu ponto de vista? Ou mera impressão? Ou, quem sabe, uma reflexão pessimista vinda de alguém tão otimista como eu? Ando refletindo tanto. E reflito sobre muitas coisas: política, comportamento, vida familiar, meio ambiente, infâncias roubadas, casamentos e status quo, o preço alto da ambição e da ganância, sobre a vida no interior e, inclusive, sobre a minha própria vida.
Sobre ser paulistana e o impacto diário de estar no interior, sobre as diferenças e semelhanças de outros “interiores”, sobre perdas, ganhos e danos. Sobre segredos que morrerão comigo. Sobre confiança que não tem preço. Sobre ser mulher e mãe, dentro das condições de cada uma de nós. Sobre os cristais que não tive e sobre a louça que não pude comprar. Sobre o casamento lindo que não tive. Sobre o vestido de noiva que não vesti. Sobre as separações que atravessaram o meu ser. Sobre a morte do ente querido. Sobre a infância com meu avô. Sobre as minhas filhas, cada uma com as suas singularidades e surpresas impostas pela vida. Sobre meu único filho homem. Sobre as diversas faces do abuso que muitas de nós sofremos.
Sobre as escolhas erradas que fiz sem saber que eram erradas. Sobre os meus acertos. Sobre o tamanho da minha perseverança. Sobre a inveja no meu caminho. Sobre empenho pela construção de um mundo melhor. Sobre ser sozinha. Sobre ter que dar conta. Sobre esperança e sobre a alegria.
É, meu caro leitor, saiba que até a pessoa mais otimista perde o tom e o ritmo, mesmo que por alguns instantes. Foram muitos enganos e engodos. Essa vida exige malícia. Característica essa que eu nunca tive. Ingênua, não é?
Haveria paz num mundo marcado por guerras desde os primórdios? Haveria lealdade, depois de Caim e Abel? Haveria certo ou errado num mundo marcado por tantas crenças, religiões, ideologias, barbaridades e diferenças ideológicas? Haveria água no deserto? Ou Deus nos coloca no deserto para testar a nossa fé? Seriam as inúmeras provações, provas do amor divino e do peso da nossa fé?
Não sei, não sei. Um pouco aflita, afirmo que não tenho respostas. Sou apenas um grãozinho de areia. Mas, este é um assunto que eu gostaria de aprofundar, em algum momento. Como quem perde o tom.
O que eu sei, de fato, é que eu sinto que amo a Deus. Sinto que existe algo tão maior, tão bonito, tão pleno e amoroso que não há palavras para descrever. E tudo aqui “embaixo” é muito pequeno diante de tamanha grandeza e esplendor.
Fechar os olhos e sentir tudo que é divino é um momento que vale a pena cultivar, com dedicação. Ainda mais quando se perde o tom e a fé parece escorregar pelas águas salgadas que escorrem pelas entranhas (se é que me entende). Pedir orientação e aguentar a aridez do deserto. Refletir, caminhar, ler, escrever, acariciar o pet, regar as plantas, cultivar o perdão. São coisas que a gente aprende. Ou tem a sorte de aprender.]