À sua espera eu vivo envolto em pranto, tentando disfarçar meus longos ais; em orações, suplico a Deus, enquanto me resta a frágil fé e… nada mais.
Sofri ao procurá-la em cada canto: pelas cidades, campos, litorais… Andei dias e noites, entretanto, não a encontrei… Irei ceder? Jamais!
Não sei por quanto tempo mais consigo sobreviver às garras do castigo: lutar contra a tortura que me invade. Antes de o derradeiro sol se pôr, me diga sem demora, por favor:
— Onde é que está você, Felicidade?
O amigo achou tão belo o soneto que, com a permissão do poeta, mandou imprimir exemplares, alegando distribuí-los em família. Mas, na verdade, a intenção era outra: que os versos alcançassem alguma pretendente, a fim de remover a solteirice do poeta.
No rodapé do poema, o amigo incluiu o endereço do autor, sem que ele soubesse.
Semanas depois, a campainha tocou. O poeta foi atender.
— Boa tarde. Em que posso ajudá-la?
A mulher de bengala tinha idade para ser a mãe dele.
— É o senhor que está procurando a Felicidade?
O poeta se lembrou do amigo que iria distribuir o seu soneto, e pensou: “Distribuir em família? Mentiroso! Ele me paga!”.
— Todo mundo está procurando a felicidade, minha senhora.
A mulher, que mal cabia no vestido capaz de horrorizar qualquer estilista, escancarou o sorriso com meia dúzia de dentes.
— Eu vim lhe dar a Felicidade.
O poeta, que passou a considerá-la lelé da cuca, deu-lhe as costas e foi entrando. Ela insistiu.
— Espera! O senhor não vai querer a Felicidade?
Ele parou e resmungou:
— Eu já sou feliz, minha senhora.
A mulher mostrou o papelzinho que estava guardado no sutiã.
— Foi o senhor quem escreveu isso? “Onde está você?”
— Isso? Isso, minha senhora, se chama soneto. E sim, fui eu.
— Diz aqui que o senhor está querendo saber onde está a Felicidade. Certo?
O poeta precisou do seu reservatório de paciência.
— Minha senhora, é apenas uma poesia. Eu estou muito feliz com a minha vida. Eu não estou procurando a Felicidade!
E sem dizer mais nada, ele entrou e trancou a porta.
Chateada, a mulher atravessou a rua, onde encontrou a neta: a mulher belíssima, de olhos claros, cabelos cacheados, corpo escultural.
— Vamos embora. Ele disse que não está procurando você.
— A senhora disse a ele que o meu nome é Felicidade Maria de Jesus?