— Rugas, rugas e mais rugas. Estou parecendo uma velha. Se tivesse oitenta anos eu até entenderia a ação do tempo. Mas com setenta e sete? Onde foi parar a minha pele de pêssego?
O marido tentou abordá-la para dissolver o azedume.
— Meu amor, você tem que entender que…
— Que o tempo passa pra todo mundo? Eu não sou todo mundo, Eugênio! Olhe bem pra mim. Todas as rugas do mundo resolveram superpovoar a minha pele. Você acha isso justo? Você consegue me explicar o porquê de a nossa diarista não ter sequer uma ruguinha?
Ele nem pensou.
— Talvez porque ela ainda não tenha chegado aos trinta.
A mulher bufou, espumou e gritou para ele ir tomar naquele lugar. Foi a gota d’água.
— CHEGA! Pouco me importa se tem rugas ou não. Pouco me importa se está gorda ou não. Você devia se preocupar em remover defeitos de caráter e se tornar uma pessoa melhor.
Por um instante ela se calou e inventou lágrimas.
— Você não me entende. Estou me sentindo feia, horrorosa…
— Você não está feia. Velhice nunca foi feiura.
— Está me chamando de velha?
No limite da paciência ele a abraçou.
— Há meses você me pede dinheiro para cirurgias estéticas. Sabe que sou contra o estica-corta-sutura, que sou contra lipoaspiração, Botox e silicone. Mas cansei. Não quero mais me indispor. Todas as nossas economias irão para o seu tão desejado rejuvenescimento. Mas não irei com você. Não quero carregar essa culpa. Vou pegar o cartão bancário e a senha.
Foi e voltou.
— Meu maridinho lindo. Você não vai se arrepender. Voltarei uma nova mulher, uma princesa, uma deusa…
Na semana seguinte ela desembarcou na capital, onde fez exames pré-operatórios. Por alguns bons dinheiros convenceu a amiga paulistana a acompanhá-la durante todo o processo.
Um mês depois, Eugênio estava podando os arbustos do jardim quando a mulher corcunda apareceu chorando em frente ao portão. Ele colocou a tesoura no gramado e foi até ela.
— O que houve? Como posso ajudá-la?
A mulher de olhos achinesados, lábios abelhas-me-picaram e nariz desalinhado, fazia um esforço gigantesco para ficar ereta, pois os seios enormes a envergavam.
— Voltei, amor. Estraguei meu rosto, meu corpo… Desculpe.
Ela chorava cachoeiras. Ele abriu o portão.
— Entre e não chore, por favor. Eu gostei do novo visual.
— Gostou? Gostou mesmo?
— Gostei. Principalmente desse furinho que fizeram em seu queixo. Um charme.
Ela correu e, antes de entrar na casa, gritou:
— Não é um furinho. É o meu umbigo.