Marcelo Theotônio, nascido e morador de Pindamonhangaba, foi o líder da seleção de Judô que conquistou quatro medalhas nos Jogos Olímpicos de Paris 2024. Ele é gerente de alto rendimento da Confederação Brasileira de Judô e chefe da equipe olímpica durante os jogos que aconteceram no fim de julho e início de agosto. Após a campanha vitoriosa, Theotônio voltou a Pindamonhangaba e concedeu uma entrevista exclusiva à nossa jornalista Aiandra Mariano, onde falou sobre sua trajetória no esporte, a mais recente conquista nos jogos e o papel de Pindamonhangaba na preparação dos judocas brasileiros.
TRIBUNA: Theotônio, como foi liderar a equipe de judô nos Jogos Olímpicos de Paris? Você já esteve presente em outras olimpíadas, mas essa foi a primeira em que foi como o líder da equipe brasileira. Fale dessa experiência.
Theotônio: Foi um privilégio, uma honra muito grande. O judô brasileiro fez história nessa edição, fizemos o melhor resultado da história do judô em Jogos Olímpicos. E os atletas deram um show à parte. Durante o evento, foi uma mistura muito grande de emoções… Dias felizes, dias tristes, e a cada dia tinha que começar do zero, esquecer a experiência do dia anterior, positiva e negativa, e iniciar um dia novo. O fato de ser uma competição individual, o dia seguinte é o início de outro atleta. Isso é algo muito sensível que tem que ser administrado na equipe. Embora participemos de muitos eventos de alto nível, os Jogos Olímpicos são diferentes, é uma outra atmosfera. Mas são todas essas emoções, mudanças de sentimentos que tornam o evento ainda mais especial. Enfim, foi especial demais, é difícil descrever.
TRIBUNA: O judô é um dos esportes que tradicionalmente mais traz medalhas para o Brasil. Como é lidar com essa responsabilidade e como você lida com essa pressão em relação aos judocas?
Theotônio: Confesso que a pressão é grande e lidar com isso é um desafio diário. A pressão faz parte do processo, e o ponto é como lidar com isso. Acredito que junto com a comissão técnica e a equipe multidisciplinar, estabelecemos como palavra de ordem a “harmonia” em todas nossas ações. Creio que tenha sido um dos fatores que auxiliaram. Outro ponto que ajudou é que já estou na CBJ desde 2012, e tive a felicidade de participar de muitos eventos. Creio que isso foi dando bagagem para lidar com esse momento.
TRIBUNA: Qual foi o momento mais tenso para você nestes jogos?
Theotônio: Teve um dia bastante tenso. Infelizmente, no mesmo dia que tivemos baixa performance na competição, o pai do treinador do time masculino veio a falecer. Esse treinador, além de um grande amigo, estávamos dividindo quarto, foi um momento difícil. Ele é muito ligado ao pai, tinha uma relação muito próxima. Esse dia foi um dia muito triste. Mas o treinador, muito profissional, teve seu momento de luto, mas se recompôs e seguiu em frente com o time, e nos dois próximos dias conquistamos medalhas.
TRIBUNA: Eu acompanhei todas as lutas dos brasileiros nos jogos e, como leiga, fiquei inconformada com a desclassificação da Rafaela Silva e do Rafael Macedo. Houve muita reclamação sobre a arbitragem nessas duas lutas. O que você achou desses resultados?
Theotônio: Eu lamentei muito! Os dois atletas foram punidos em um momento em que eles estavam superiores na luta, e quando isso acontece dói bastante. São situações complicadas, mas no judô não tem protesto. A única coisa que se pode fazer é preencher um documento e depois, no intervalo ou no final da competição, a comissão de arbitragem justifica a decisão tomada. Foi isso.
TRIBUNA: Após as medalhas logo no início dos combates, esses percalços no caminho dos atletas e o ouro incrível da Bia, como foi feita a preparação, principalmente mental, para a disputa por equipes?
Theotônio: Mantivemos a harmonia estabelecida desde o início. Além da comissão técnica, os atletas tiveram um papel muito importante nessa retomada, mantiveram o foco e se uniram. Em especial, para a competição por equipes, eles estavam determinados a buscar a medalha. Durante as escalações, eles participaram das estratégias, nas decisões puxavam a responsabilidade para si, foi uma vivência incrível!
TRIBUNA: A disputa pelo bronze por equipes foi muito emocionante. Dá para manter a tranquilidade como chefe de equipe? Como você é na hora das lutas? Conta pra gente como viveu esse momento.
Theotônio: Honestamente, não! Eu não fico tranquilo no momento das lutas, tento me controlar. Eu fico tranquilo na área de aquecimento, onde os atletas estão em concentração antes das lutas e temos o último contato com eles antes de entrarem na área de competição. Durante a luta, eu fico em um local reservado para atletas e oficiais, junto com os atletas que não entraram no combate e demais membros da comissão. Desse local, tentamos incentivar a equipe. A conquista do bronze foi emocionante! Além do resultado histórico como melhor campanha, foi a primeira vez que conquistamos medalha na competição por equipes nos Jogos Olímpicos. A equipe estava muito determinada, foi um dia incrível, muito especial.
TRIBUNA: Várias vezes durante esse ciclo olímpico, e nos anteriores, a seleção brasileira treinou em Pindamonhangaba. Fale um pouco dessas experiências e da ligação da equipe com a nossa cidade.
Theotônio: Estamos treinando sempre em Pinda, ao menos uma vez ao ano. Esse ano mesmo, em abril fizemos um treinamento internacional, contamos com a participação de oito países, nesse evento aqui em Pinda, que serviu como preparação para o Campeonato Pan-americano deste ano. Um evento muito importante para a classificação e preparação para os Jogos Olímpicos. Inúmeros atletas de outros países que participaram e conquistaram medalhas em Tóquio e Paris já treinaram conosco aqui em Pinda. Os atletas já estão acostumados com a cidade, a estrutura que utilizamos no Hotel Colonial Plaza, onde está nossa base aqui na cidade, é uma estrutura muito adequada para esse tipo de treinamento e para os períodos de concentrações.
TRIBUNA: Para encerrar, após os Jogos você veio descansar em Pinda com sua família. Quais os seus próximos passos na seleção?
Theotônio: Na realidade, fiquei em casa uma semana assim que cheguei, mas já retomei os trabalhos. Nesse início não conseguimos parar, o ciclo de Los Angeles já começou e precisamos ajustar alguns pontos do planejamento, que é muito importante nesse momento. Em toda virada de ciclo, nos últimos anos, fazemos investimentos em atletas promissores para o ciclo que se inicia, é algo que tem dado certo, e que seguimos apostando. No mês que vem, vou conseguir tirar alguns dias em casa e aproveitar um pouco mais a família e a cidade!