Você tem muitos sonhos engavetados? Ou já desistiu de sonhar? E você que está aí nesse cantinho pensando sobre quantos dos seus sonhos abriu mão por conta do desejo ou expectativa de outrem? Valeu a pena?
E você, que sequer ousa sonhar porque te fizeram acreditar que nesta vida temos apenas dois caminhos para alcançarmos o sucesso: ser médico ou advogado. Seguir o Direito ou a Medicina, eis o destino dos predestinados ao sucesso! Risos. Pois é, nossos pais nos impõem essas carreiras como se fossem as duas únicas alternativas para obtermos prosperidade. Como se não existissem outras alternativas, ou sequer vontade e propósito em nossa alma.
Lá em casa, fui “ensinada” a não ouvir os meus instintos, as minhas intuições, o meu coração; e nem sequer a minha vontade mais genuína. Aliás, quem deveria ser eu a não ser aquela que preenche os requisitos da filha preferida? Ah, ela é tão obediente, estudiosa, meiguinha, exemplar! É claro que ela será médica! Eu era a única possibilidade dentro da família.
Ui, que cruz eu carreguei sem nem perceber! Mas, ela estava lá nas minhas costas, com toda a expectativa do meu pai. A filha médica, mas que ele se recusava a pagar uma faculdade de Medicina. A minha única opção seria passar na Fuvest, no vestibular de medicina. Mas, esse feito não é possível para pessoas com QI acima da média, como eu. Talvez, só passem na USP os superdotados. São duas fases, ou eram, pelo menos. E duas fases bem difíceis de passar. Mas, eu passei para a segunda fase, e emperrei ali.
Adquiri, praticamente, uma anorexia nervosa, emagreci muito, perdi o apetite e parei de menstruar. Nessa época, eu cursava o Anglo, da rua Sergipe, em São Paulo; ali pertinho do cemitério da Consolação. Enquanto os jovens estavam indo fumar maconha no cemitério, ou coisas do tipo, eu estava internada nas salas de estudos, engolindo e devorando os livros com as tarefas complementares. Ser médica virou uma obsessão paterna, embutida em mim. Que delírio!
Talvez, o meu pai visse em mim essa vocação para o cuidado e o zelo. E eu amo mesmo cuidar, acolher, ouvir, escutar, amparar. Seria sim uma excelente médica. Mas, ele pagou a faculdade para a filha que veio depois, de um segundo casamento, e que não tem a menor vocação para a profissão! Ela sequer exerce a medicina. Nasceu para brilhar de outro jeito.
Coisas da vida, coisas de pai. Coisas que a gente nunca vai entender. E eu? Eu sigo amando a minha profissão. Sou terapeuta, sou da saúde, sou da urgência. Amo estar aqui. Por amor, eu zelo, amparo e cuido.
E você? Existe para quê e para quem?