Faltava ainda uma semana para o carnaval de 1924, que naquele ano aconteceu nos dias 2, 3 e 4 de março, quando a Tribuna do Norte (edição de 24/2/1924) divulgou aos leitores a letra do maxixe que prometia animar os eventos carnavalescos intitulada “Encoste… mas não me aperte”. (Sobre o maxixe veja nota ao fim da matéria) Revelava o jornal que o autor da música fora Henrique San Martin e da letra o Jercy Jacob (poeta sonetista e redator da Tribuna do Norte).
“Para a nossa população familiarizar-se com o novo maxixe, que nestes dias deverá estar à venda, conseguimos obter dos compositores a letra que publicamos para que os cordões a decorem, tornando-se, pois, mais fácil a cantar…” E, em seguida, vinha a letra: “Encoste… mas não me aperte! Ó sinhazinha, toma cuidado, aguenta firme contra o repuxo, (Bis) não caias tanto para o meu lado, Deixa de fita, pois isso é luxo! (Bis) Estribilho Mulata não me aperte, não me faça padecê, encoste… não me aperte, que me faz enlouquecê. Eu bem te aviso e depois não digas que eu te apertei e não fui correto: (Bis) Porque eu não gosto de tais cantigas; não sou santinho, mas vivo quieto… (Bis) Estribilho Mulata não me aperte etc… Ninguém me aperte, se tiver juízo, mas dê me folga, que eu bem aviso. (Bis) Ninguém me aperte, que o mundo é largo; não sou sardinha, sou bicho amargo. (Bis) Estribilho Mulata não me aperte etc… Ó tia véia, quem foi que disse Que eu concordasse que o carnavá (Bis) É fio da troça, pai da tolice, E é pega, empurra, ‘guenta pessoá’!… (Bis) Estribilho Mulata não me aperte etc… Não divulgou a festa.
É curioso o fato do jornal Tribuna não haver divulgado os três dias de folia na cidade naquele ano. Nada foi comentado referente ao movimento carnavalesco nos salões (Clube Literário, Eden Cinema etc.) ou nas ruas. Na edição de 2/3/1924, domingo de carnaval, o espaço dedicado à programação dos filmes a serem exibidos no Eden Cinema, então famosa casa de espetáculos de Pindamonhangaba, embora tenha sido iniciado com breve comentário a respeito: “Este apreciado centro de diversões, que incontestavelmente será o ponto preferido pelo público de Pinda para os festejos de carnaval…”, o jornal só divulgava as fitas cinematográficas que seriam exibidas naqueles dias de carnaval.
Não mencionava o horário da exibição, o que nos leva a deduzir que as brincadeiras e filmes dividiriam, cada qual em seu horário, aquele local. Na mesma edição um artigo poetiza o carnaval e seus personagens (Arlequins, Pierrôs, Colombinas etc.) sem, no entanto, exaltar os festejos na cidade com a animação peculiar que o assunto envolve: “Ao raiar do sol de hoje ouvimos, vindas de longe, de muito longe, as madrigalescas protofonias do carnaval. Mercúrio e Íris, envoltos em serpentinas, embriagados pelo lança perfume, bailando em confetes, trazem a mensagem de Evoé…” O artigo parece sugerir aos jovens para que não haja exageros na folia: “Mocidade! Eia, avante! Mas cuidado, que o arauto é da ilusão e da ventura efêmera…”
Passado o carnaval de 1924, nas edições seguintes da Tribuna não se publicou como fora a comemoração momesca na cidade. Veio outro artigo no mesmo estilo poético, com certeza do mesmo autor pregando ponderação nos três dias de diversão: “Desde que Momo nos visitara em 1923, ansiosa, muita gente boa suspirava pelo seu regresso em 1924. Veio. Trouxe consigo a época e sorrisos – três dias felizes em que desabrochou em cada peito uma flor de volúpia, e em cada artéria circulou o sangue do delírio, sangue que falava na linguagem dos olhos! Lançou pela terra – quem sabe?!… em meio aos beijos a rodo, ao acotovelar de gente enlouquecida, ébria e perfumada pelo lança perfume, a discórdia e a insânia nos lares, porque à ponta do adelgaçado veio o diáfano de ilusões com que Momo se envolve, prende-se um sudário embebido de lágrimas, de arrependimentos, de suicídios e de demais coisas que a alma sente, mas sem poder confessar-se mesmo a si própria”.
Ainda prosseguiu: “Dorme cidade, agora, Descansa. Não foste um manicômio; alegraste para bem receber o deus Momo. Durante o teu infernal delírio deixaste de ouvir a celeuma contra a vida alheia. Agora Pindamonhangaba, dorme no teu tálamo de glória o sono enorme, o sono de mais de dez mil viventes…” E, destoando daquele discurso próprio das quartas-feiras pós-carnaval, assim concluía o articulista seu escrito: “Viva o carnaval para a alegria dos povos!”
Maxixe
Nome de uma dança brasileira de par enlaçado, nascida no Rio de Janeiro por volta de 1870, por derivação do lundu dançado pelos escravos.
Dançado em ritmo rápido, foi a dança mais importante nos salões brasileiros até o surgimento do samba. O maxixe apresentou-se inicialmente nos bailes de carnaval e no teatro de variedades onde ganhou popularidade como estilo de dança livre e exótica.
Levou tempo, porém, para o maxixe ser dançado nos salões senhoriais devido às suas origens negras e mestiças e os movimentos sensuais que permitiam ao homem “empernar” a mulher”, como se dizia então.
Era chamado de “dança do povo”. Daí compositores como Ernesto Nazaré e Chiquinha Gonzaga registrarem seus maxixes como “tango brasileiro” para não sofrerem discriminação da elite brasileira.
Foi somente no início do século XX que o maxixe foi aceito pelas famílias brasileiras mais abastadas. Por essa época, a dança era apresentada em teatros da França e Portugal fazendo enorme sucesso a ponto do papa Pio X pedir uma exibição, que ocorreu em Roma, em 1913.
Seguiram-se outras apresentações internacionais na Europa e na América do Sul (Argentina, Chile e Uruguai) que só perderam interesse com a chegada do charleston e do fox-trot americanos por volta de 1920.