Na madrugada de domingo o cavalo estava selado, na frente da igrejinha, para a longínqua viagem. O padre segurava as rédeas, aflito, pedindo ao céu que enviasse alguém para cuidar do santuário durante a sua ausência. A primeira viva alma que apareceu foi Astolfo Foquinha. O padre pensou “Este fofoqueiro não, Senhor!”, mas a urgência não admitia prolongar a espera.
— Preciso de um favor. Avise a todos que não haverá missa hoje. Estou indo dar uma extrema-unção. Provavelmente, só voltarei amanhã. Aqui está a chave da igreja. Feche-a às 20h e a abra amanhã às 6h.
— Antes me diga, padre, extrema-unção para quem? Eu conheço?
Sem responder, o padre se ajeitou no dorso do animal, levantou poeira e desapareceu na estrada.
Astolfo, mais conhecido como linguarudo da cidade, teve uma ideia. Colocou um cartaz na entrada da igreja com os seguintes dizeres: “Hoje não haverá missa. O domingo será dedicado às confissões”. E se enfiou no confessionário. Para não precisar falar, providenciou papeizinhos com a mesma penitência: “Reze o Ato de Contrição, dez vezes o Pai-nosso e vinte vezes a Ave-Maria”.
A primeira pessoa que apareceu foi a mulher do quitandeiro.
— Padre, confesso que pego dinheiro no caixa da quitanda. Meu marido não sabe. Não consigo dormir por causa disso. Deus me perdoa?
Tão logo recebeu o papelzinho com a penitência, ela saiu. Depois quem se confessou foi o leiteiro.
— Minhas vaquinhas andam preguiçosas, seu padre. E não tem o que dê jeito nelas. Por isso, para atender a freguesia tenho que misturar água no leite. Mas eu juro que assim que elas voltarem a produzir o suficiente eu pararei de batizar o leite.
Em seguida, a irmã da mulher do barbeiro contou:
— Padre, meu cunhado é muito chato. Todas as vezes que visito a minha irmã ele implica comigo. Sabe o que eu faço? Coloco laxante na bebida dele. Assim ele fica no trono e não me aborrece. Isso é pecado?
O próximo foi o pasteleiro.
— Os moradores estão dizendo que sou o responsável pelo sumiço dos gatos da cidade só porque o preço da carne está pela hora da morte. Mas eu juro, padre, que não tenho nada a ver com isso. Quero ver o senhor mortinho se a culpa for minha.
Quase na hora de fechar a igreja, a mulher do Astolfo entrou e se ajoelhou no confessionário.
— Eu não vim me confessar. Só vim desabafar. Eu não suporto mais conviver com meu marido. Ele não gosta de tomar banho. Não usa desodorante. Ele usa três dias seguidos a mesma cueca. Ele urina fora do vaso e não dá descarga. E o pior: ele acha que sou boba. Ele pensa que eu não sei que ele está aí dentro desse confessionário fingindo ser o padre.
No dia seguinte souberam que o padre havia caído do cavalo, batido a cabeça numa pedra e morrido. Culpa do pasteleiro?