Ao escolher o feijão para o almoço, fiquei observando cada grão espalhado pela mesa. Em certo momento, pensei: “Cadê os ‘elefantinhos’ do feijão, que outrora povoavam felizes entre os grãos?” Lembrei da minha infância, quando minha mãe escolhia o feijão e eu, sentada ao seu lado, brincava com os “elefantinhos” que saíam correndo pela mesa, tentando se esconder. Eram os famosos carunchos, pequenos besourinhos que, dentro da lata de feijão, viviam quietinhos sua vida. Não faziam mal a ninguém, sua presença fazia parte do ciclo natural. Os grãos de feijão sempre conviveram bem com eles e continuavam sendo feijões.
Notei que isso começou a mudar. O feijão ainda é o mesmo, mas os “elefantinhos” desapareceram. Ao abrir um saco de feijão ou escolhê-lo na mesa, não vejo mais os bichinhos. De repente, o feijão parece mais “limpo”, mais perfeito. Talvez fossem um discreto aviso de que a natureza estava presente, protegendo seus próprios mistérios. Seriam os agrotóxicos e defensivos agrícolas, agora mais utilizados para garantir a “perfeição” do feijão? Ou o feijão moderno, tão tratado e manipulado, perdeu a capacidade de acolher e abrigar esses pequenos insetos?
Para alguns, é mais uma consequência do progresso. “Agora é assim”, dizem. “Não tem mais lugar para os ‘elefantinhos’ do feijão”. Com o desaparecimento deles, o produto parece sem história, sem vida. Hoje, é apenas o feijão: liso, sem marcas em sua “pele”. Quando abro um pacote, olho e vejo apenas grãos perfeitos e redondos. Não há mais “elefantinhos”. É como se o feijão tivesse perdido a sua “alma”. Só quem cresceu vendo aqueles pequeninos insetos correndo pela mesa pode entender.
O desaparecimento dos carunchos, ou “elefantinhos”, como eu os chamava, é um sinal de que estamos deixando para trás as pequenas coisas que nos conectam com o simples e o natural. Se algum dia esses “elefantinhos” simpáticos voltarem, virão para nos lembrar de que a vida, às vezes, mora nas pequenas imperfeições.