Me chamo Tonho. Moro com minha muié na paioça que fica lá nas beiradas do rio. Tenho um gato amarelo, o Marelão, e um cachorro meio véio, vira-latinha, muito brabinho. Chamo ele de Purguento porque ele tem purga desde piquininho. Já demos banho de tudo nele. Já levamos ele no veterinário. Inté simpatia fizemos. Num adianta nada.
Purguento é meu mió companheiro. É bão de caça e bão pra protegê eu. Uma vez espaventou a jararaca que tava escondidinha debaixo do banco, adonde eu tava pitando. A marvadinha tava preparadinha pra dá o bote. Ele mordeu o rabo dela e saiu correndo com ela na boca. Fui atrás dele e vi ele estraçalhando ela.
Ele é meu fiér amigo, mió que as gentarada que conheço. Purguento num fala mar de mim, num chama eu de Zoreia, num fala que sou imprestável. É claro que eu sei que ele num sabe falar. Mas os zóio dele fala, e fala só coisa bunita. Quando eu tô triste ele se achega pra ponhá as patinha em mim, querendo abraçá eu.
Ah, Purguento, se num fosse ocê eu num aguentaria aquela véia miserenta da minha sogra que veio dormir aqui em casa ontem. Eta mulherzinha parpiteira, encrenqueira e que come mais que elefante. É ela que chama eu de Zoreia e imprestável. E toda vez que ela vem aqui em casa, faz eu e a minha muié dormir noutro quarto. A desculpa dela é que a minha cama é a mió que tem. Bobageira dela. As duas cama é igualzinha. É só pra fazer nervoso em mim.
Mas ontem, eu arresolve judiar da véia. Depois do almoço, esfreguei o Purguento na cama adonde ela ia dormir. Também peguei carrapato das vaca e espalhei debaixo do lençol e pus no travesseiro. Depois vim capinar a roça. E como eu num queria ver a cara da véia, voltei pra casa tardinha da noite. Minha muié tava na porta e falou:
— Adonde cê tava, hómi? Tava isperando ocê pra dizê que hoje cê vai tê que dormir na cama sozinho. Minha mãe tá chocada com a morte do padrinho e qué que eu durma com ela.
Abri a boca pra dizê que a cama tava cheia de purga. Mas ela num deixou eu dá um pio.
— Chiu! Fica queto! Num adianta cê dizê nada. Já decidimo. Hoje vou dormir com minha mãezinha. Tadinha dela. Tá se borrando de medo de sombração. Boa noite procê. Inté manhã.
Virou as costa, apertou os passo e foi se trancá no quarto com a véia medrosa.
Hoje, quando fui tomá café, a véia tava sorrindo, arreganhando a boca de dois dente. Me tratou com respeito, me deu pedaço de bolo de fubá, inté agradeceu por deixar ela dormir com a fia.
— Tonho, cê desculpa eu, meu genro? Como cê demorou pra voltar da lida, eu e a fia trocamo os colchão porque o Marelão mijou nele.
Tava explicado! Por isso eu tava com o corpo todo pinicando, encaroçado. Marvada purga! Marvado carrapato! Marvada véia!